11 de set. de 2011

23 - ALTER EGO

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De vez em quando, lá muito de vez em quando, dou por mim a atravessar uma situação, ou uma fase, ou uma crise, ou algum tipo de novidade que me toca profundamente. E, em função disso somado a tudo o mais que já sou, prevejo que vai chover no molhado, e que se avizinha mais uma mudança em mim - coisa que tem sido frequente, seja em termos geográficos ou em quaisquer outros.

Fico preocupadíssimo e acabo escrevendo textos como este abaixo, que já data da última mudança.

Mas mesmo mudando, lá vou sobrando eu - em restos, talvez. Em todo o caso, o suficiente para me reconhecer ao espelho e naquilo que escrevo. Entretanto, a proximidade de uma fase destas sempre gera um momento de, sei lá ... despedida ! Vai que mudo para um outro qualquer, muito diferente ?  E as saudades que vou ter de mim ?

Por outro lado,  que delícia vai ser descobrir esse outro sujeitinho, heim?


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Sempre há um tempo
( um momento congelado entre tantos )
para se riscar na poeira acumulada dos silêncios
( como quem  o traça em fluidos golpes de esgrima )
o  caracter antigo e de simplicidade inexcedível
( de outra forma destoaria )
com que nos assinamos realmente.
( embora a areia mostre outros passos ensaiados ).

Sempre há um tempo
( o suspense  dolorido entre duas batidas de coração )
em que a distância é como uma estrada ao longe
( onde nos vemos passar acenando gestos de adeus )
por onde desfilam  os vultos de todos os outros
( demoramos a ver que não somos apenas nós )
olhando-nos num gesto  de  soslaio apressado
( repletos dessa mesma inveja que sentimos )
que só nos avalia a serenidade exterior
(ah ! como é doce a tranqüilidade dos outros )
enquanto rumam a lugares onde não queremos  ir.
( embora assolados por vagas de desejos  ).

Sempre há um tempo !
( embora ás vezes falte tanto...)



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2 comentários:

  1. Meu dileto amigo Henrique,

    As mudanças sempre trazem consigo o inusitado, o desconhecido e às vezes descobre-se nelas também o que é exaustivamente normal. E sempre há um tempo de descobrir o que elas podem nos proporcionar.

    Seu texto é uma extraordinária construção, soa quase como um dialógo entre os "eus", aquele que quer ficar e aquele que ir a outros rumos, numa tentativa de ver na mudança, o caminho certo por onde se deseja caminhar.
    Um abraço da sua amiga,
    Celêdian

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  2. Meu caro Henrique,

    vc teceu um contraponto muito inteligente neste seu poema-crónica-ensaio. Os versos entre parênteses são um poema dentro de outro poema, a coerência de pensamento e literária se mantém de forma autônoma. O mesmo se dá com os demais versos, sem parênteses. Magnífico!

    Oh, tempo, suspende teu vôo!... disse o poeta, uma vez. Essa ilusão que nos escraviza e limita, omnipresente e mesmo obsessiva em nós, é sempre fonte de inspiração, deveras. Realmente, meu amigo, o tempo (ou a noção que temos dele) continuará fluindo qual um rio sob uma ponte. As águas, uma vez passadas, jamais serão as mesmas e nem voltarão. Seu belo (e inteligente) poema fala disso.

    Um forte abraço, escrevo-lhe mais, depois.

    André

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