23 de jan. de 2018

159 - INFINITUDE




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O poema afastou-se, depois
de ter assomado ao longe
numa promessa imensamente
vaga de que ia chegar.


Percebi quando se agarrou
a um detalhe qualquer
e se esfumou em sólidas
concretudes inadiáveis.


Deixou um lamento.
Tinha nascido igual a todos,
um fantástico poema único
ainda por ser de facto.


E deixou um buraco no mundo,
mesmo que as casinhas ao longe
ainda desenhem sorrisos alegres
na face da montanha repetida.


Com ele foi-se o mistério,
o traço insubstancial e fino
com o qual se adequa o mundo
ao bem estar do espírito.


E assim perdeu a voz
aquela chama, apenas nascida,
de algum pormenor singular
levemente ao lado de algo.


E adiou-se o poeta, é claro,
no seu ofício extraordinário
de trazer para o mundo
a poeira encantada das estrelas.



copyrightHenriqueMendes/2017


1 de jan. de 2018

158 - NOVO FIM






Quando o tempo se encolhe,
perde importância o que pouco importa.
Chegam respostas a perguntas esquecidas,
bordejando caminhos sem rumo claro, 
como flores preciosas e acidentais
que definham por falta de atenção
depois de gritarem cores.

Rasgam-se cartas não escritas.
Guarda-se o papel que ninguém usou
e o envelope que permanece vazio, 
onde não se colaram selos nem sonhos, 
nem se escreveram destinos.
Arrumam-se cansaços antigos,
feitos de esperas e vigílias, espessos de
militâncias por valores e crenças maiores.
Levantam-se tapetes tranquilos
em busca de lixos escondidos 
com aparências de normalidade.
Varre-se, prescinde-se, arruma-se,
esvazia-se, define-se um outro esquema
para o porvernir já menos distante.
Abre-se mão de medos, resistências,
lamentos, quezílias as mais diversas
-tudo em nome da leveza para a viagem 
que começa já no próximo instante.
Percebem-se sombras fugazes,
mas quase sempre são esperanças
que nascem furtivas.
Faz-se um espaço vazio depois do ajuste,
como um berço onde embalar medos.
Mas é onde semeamos vontades 
e desfraldamos velas, querentes de vento,
que nos levem pelo mar desconhecido
das travessias necessárias.
O novo ano começa fremente,
e há galopes na manada das horas
disparadas em todas as direções,
já perseguindo metas esquivas.
E por cima de tudo há uma campânula
de silêncio adivinhado onde, aos poucos,
hesitantemente, nos vamos reconhecendo 
nos  pequenos nadas  que somos,
coisas tão nossas e inconfundíveis
como gestos íntimos.
E em toda essa agitação e alegria,
há mais um ano que ainda mal nasceu
mas que já caminha para o seu fim
-como sempre acontece.