9 de abr. de 2018

163 - NEM SEMPRE ASSIM


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Nem sempre a noite me permite
o descanso singelo do corpo.
Há vezes em que a mente se agiganta
e se impõe, busca o espírito e o além,
e apequena sem dó qualquer outra coisa.
Perco o sono como quem adormece,
repentinamente, numa energia súbita
de quem quer mais que o repouso
e a ausência do momento sentido
num passo a passo doloroso,
de fascínios conhecidos, talvez viciante.
Os sons da  casa estão suspensos,
não há movimento na rua, nem ruídos,
e a solidão torna-se em algo mais,
como um tipo estranho de consciência.
Não me importo com a janela,
distante meia dúzia de passos inúteis.
Sei que as estrelas não estão lá,
que dormirão toda a noite
por detrás das núvens invisíveis
sobre os telhados das casas,
sem brilhos, escondidas da noite
e de mim.
E a lua está ausente do rio,
a água ignorada como se não fosse sua,
e a outra margem perdida no escuro
como se não soubesse a falta que me faz.
Entre mim e ela passam as águas
de um rio que assim não passa,
pois sem margens não há rio,
e se o rio não passa
eu não vou , nem passo,
nem me entrego acompanhando
o seu perpétuo adeus.
Também não passa o tempo, sem adeus,
e a quietude impõe-se, muito maior
que a soma dos silêncios e das ausências.
Por isso apenas fico. Até que o dia chegue
e me apeteça não estar,
e adormeça porque os sentidos desistem,
o mundo se dilui em nada,
e os outros deixam de fazer sentido.


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