Por algum tempo tive medo do tempo.
Olhava tudo com aqueles olhos cansados que só tem
quem acha que sabe muito
de si e das coisas.
Deambulei de acordo
com a vontade dos momentos.
Achei que, na curva do rio, a água cantava contra as pedras,
enquanto se perseguia a si mesma para longe de mim,
canções de despedida que eu não voltaria a escutar.
Caminhei pela cidade acariciando-lhe aqueles recantos
que a tornavam especial aos meus passos errantes,
abrigos de vento e chuva, cantos para repousar tranquilo.
Lembro nas costas das mãos da temperatura das pedras
E sinto ainda na boca o sabor da água correndo incessante
em antigos chafarizes de bronze.
Olhei aquela rocha lá no alto, junto ao castelo, e
despedi-me
da vista que de lá se tem, de barcos cruzando rio,
numa luz que não é tão
dourada em mais lado nenhum.
Pouco a pouco fui entendendo o que procurava entender.
Voltei a encantar-me com as mesmas pequenas coisas
que o tempo não me deixará repetir.
Haverá gentes fazendo coisas, cores colorindo instantes,
barcos navegando ondas ao fim de um qualquer magnífico por
do sol,
que eu não voltarei a ver simplesmente porque não estarei lá.
Pensei sobre tudo isto, em vagares inusitados. E medos
também.
Depois , a lua apanhou-me descuidado.
Usou a pulsação das ondas, a
efervescência da areia,
e os piados secretos das aves nocturnas , e empurrou-me
sem aviso para
memórias de outras noites ventosas
na praia brilhante, quando quis estar só.
E eu sei como é essa areia gelada. Os jeans molhados nas
pernas.
O crepitar efervescente quando as ondas se recolhem.
Um silêncio rico de som, onde os outros não estão.
Eu sei como é…
Então sobreveio uma vontade feita daquilo que não sei ainda.
Feita daquilo que não
aprendi em primeira mão.
Daquilo que não fiz.
E o tempo fica menor, se pensar em quanto é isso tudo.
Retomo devagar os meus passos.
Não repiso.
Observo, guardo.
Cuido.
Estou.
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