22 de jun. de 2012
51 - ALMA
Encomendei á alma
um poema,
mas tudo o que me vai chegando
são apenas palavras-pássaros voando
- planando em noções esparsas,
não em vôos de garças
- de uma poesia
menor que as sedes do meu dia,
remota e vaga,
não um fruto, apenas baga...
(e palavras fracas, confusas,
aspirações difusas
de sombras em becos
onde soam ecos
e vozes em suave agonia...
-não o poema que eu queria !)
Talvez o meu poema, afinal, não seja
essa coisa luminosa, benfazeja,
e chegue por entre as palavras e as vontades,
encolhido em vergonhas de novidades,
subtilezas de bodas só suas,
um cântico ao luar, de sereias nuas...
( 25 de Abril de 2007 )
50 - DUELANDO
( dedicado ao outro, que também sou )
Às vezes, escreves palavras de amor
como se fosse fácil.
Como se não houvesse maiores dificuldades
do que abrir as asas e sair voando alto,
ascendendo rumo ao sol...
Como se fosse possível, assim,
num instante único e de supremo alcance,
pintar em cores felizes
esses quadros que partilhamos,
quando encostamos as testas ao espelho
e reconhecemos no outro, do lado de lá,
as fomes que nos fazem sede,
e as dores com que nos fustigamos.
Às vezes, escreves palavras de amor
como se não soubesses outras,
e, em purezas primordiais,
não tivesses já gravado anseios
em rabiscos de criança, pelas paredes
e nos muros do meu jardim...
E como se não houvesse um preço,
a pagar por todo e qualquer começo,
por todas as coisas iniciadas
sem um rumo definido,
como se fossem um balão mal inflado,
que alguém tentasse encher de beleza,
e que brilha por um momento apenas,
antes de estourar...
Às vezes, escreves palavras de amor
como quem esgrime duais combates
em passos de bailarino,
e gravas na carne dos outros,
em volteios virtuosos
e finos traços de florete,
palavras capazes de furar armaduras,
e derramar sangues...
Às vezes, até escreves palavras de amor
como quem ama, simplesmente,
e despertas-me vontades de , um dia,
apenas pelo tempo de um único dia,
marcado o momento e o espaço,
separarmos as mentes,
desencostarmos as testas
em rígida trégua de vontades,
e vermos o que cada um seria,
olhando o espelho,
a coragem versus a imagem,
e com que armas o enfrentaria...
- se floretes, se sabres ...
14/6/2007
18 de jun. de 2012
49 - VIBRATO
É mais complicado que tudo isso...
Mais que apenas o olho, ser o vento,
o cisco, a lágrima,
o sal no trilho aberto em selvas de barba...
Mais que apenas as mãos em gestos,
pontuando formas e sentires de momentos
escritos em entardeceres boreais, perpetuando-se...
ser as carícias táteis, buscando ainda,
talvez para sempre, os cálidos vestígios da intimidade única,
do instante insubstituível da chegada.
Mais que toques transacionais, gentis, contando histórias
onde as palavras são apenas artifícios evocando brilhos escuros
nos olhares, doutra forma esquecidos de si.
Preciso ser mais. Sempre precisei ser mais.
Tenho de ser a sílaba,
que encontras e reconheces entre palavras tuas.
A pausa que antecipa o sorriso por acontecer,
quando me tornas teu.
O tom colorido, na frase monocórdica,
com que me retomas ao desinteresse
com que me perdi no teu olhar...
Preciso ser mais,
por isso nunca serei completamente teu,
nem meu...
Por isso nunca haverá nada
que eu possa ser completamente.
Nem sequer apenas um pedaço de mim.
Maio/2010
17 de jun. de 2012
48 - EL BREVE ESPACIO EN QUE NO ESTÁS
El Breve Espacio En Que No estás
Pablo Milanés
Todavía quedan restos de humedad,
sus olores llenan ya mi soledad,
en la cama su silueta se dibuja cual promesa
de llenar el breve espacio en que no está.
Todavía yo no sé si volverá, nadie sabe,
al día siguiente, lo que hará.
Rompe todos mis esquemas,
no confiesa ni una pena,
no me pide nada a cambio de lo que dá.
Suele ser violenta y tierna,
no habla de uniones eternas,
mas se entrega cual si hubiera
sólo un día para amar.
No comparte una reunión,
mas le gusta la canción que comprometa su pensar.
Todavía no pregunté "¿te quedarás?".
Temo mucho a la respuesta de un "jamás".
La prefiero compartida antes que vaciar mi vida,
no es perfecta mas se acerca a lo que yo
simplemente soñé...
Suele ser violenta y tierna,
no habla de uniones eternas,
mas se entrega cual si hubiera
sólo un día para amar.
No comparte una reunión,
mas le gusta la canción que comprometa su pensar.
Todavía no pregunté "¿te quedarás?".
Temo mucho a la respuesta de un "jamás".
La prefiero compartida antes que vaciar mi vida,
no es perfecta mas se acerca a lo que yo
simplemente soñé...
sus olores llenan ya mi soledad,
en la cama su silueta se dibuja cual promesa
de llenar el breve espacio en que no está.
Todavía yo no sé si volverá, nadie sabe,
al día siguiente, lo que hará.
Rompe todos mis esquemas,
no confiesa ni una pena,
no me pide nada a cambio de lo que dá.
Suele ser violenta y tierna,
no habla de uniones eternas,
mas se entrega cual si hubiera
No comparte una reunión,
mas le gusta la canción que comprometa su pensar.
Todavía no pregunté "¿te quedarás?".
Temo mucho a la respuesta de un "jamás".
no es perfecta mas se acerca a lo que yo
simplemente soñé...
Suele ser violenta y tierna,
no habla de uniones eternas,
mas se entrega cual si hubiera
sólo un día para amar.
No comparte una reunión,
mas le gusta la canción que comprometa su pensar.
Todavía no pregunté "¿te quedarás?".
Temo mucho a la respuesta de un "jamás".
La prefiero compartida antes que vaciar mi vida,
no es perfecta mas se acerca a lo que yo
simplemente soñé...
47 - HOMENAGEM A CAMÕES ( pelo10 de Junho )
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança;
Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Continuamente vemos novidades,
Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades.
O tempo cobre o chão de verde manto,
Que já coberto foi de neve fria,
E em mim converte em choro o doce canto.
E afora este mudar-se cada dia
Outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soia.
46 - CASSETAS
Encontrei ontem, mais uma vez, uma fita cassete que andava
no porta-luvas do carro fazia um tempão.
Consegui finalmente deitá-la fora, sentindo que se tinham
exaurido todas as desculpas que negociava comigo mesmo, no sentido de a manter.
O aparelho de som deste carro, não reproduz fitas. Apenas CD’s. Da mesma forma, o do carro anterior,
também não. Nem o outro, antes, nem o anterior a esse. E, com toda a certeza,
como enfeite, eu não a traria comigo...
Então, porque a carreguei todos estes anos?
Carreguei-a pelas estradas e pelos calçamentos impiedosos de
Itapecerica, inútil, barulhenta e cheia de vibrações, desajeitada de
acomodar... - mas aconchegante ! Uma
pequena ilha de certezas, imutáveis, no meio de um oceano de coisas mudando
muito depressa, no fluir dos meus dias.
Lembro-me de a ter gravado, querendo que fosse eterna, antes
de vir para o Brasil. Escolhi apenas
músicas que me tocavam profundamente, e municiei-me de equipamentos de
ultimíssima geração, visando a ultra-qualidade. O resultado final foi
fantástico, e realmente serviu-me de apoio, constituindo uma espécie de âncora
emocional que me manteve estável nos primeiros tempos, neste meu novo país.
Na verdade, até não tocou muitas vezes. Apenas quando já não
estava agüentando mais música axé, que entretanto se apossara das rádios vinte
e quatro horas por dia, até ser destronada por essa enorme onda monotemática de
música sertaneja, que dura até hoje. Pensando melhor, creio que, afinal, tocou muito, sim. Tocou para valer...
Apesar disso, sempre brilhou como uma pedra preciosa, lá no
fundo do porta-luvas, socorrendo-me quando, inconformado com o que me era dado
ouvir pelas rádios, ansiava por mais, querendo melhor, diferente, noutras
línguas de outros povos, mais variado, mais qualquer coisa que não fosse apenas
aquilo.
Mas o tempo, esse danado, trouxe com ele a habituação, o
entorpecimento, e o meu ouvido foi-se re-educando para essa nova realidade, tão
árida. Aos poucos, outras realidades musicais, outras experiencias, foram
ficando mais e mais débeis, menos objeto de desejo, mais amorfas e vagas.
( Neste ponto, abrem-se outros raciocínios, colaterais,
quando penso como somos passíveis de ser educados até para a aridez, bastando
para isso teimar sobre um mesmo tema, sem permitir temas alternativos. Torna-se
clara a importância dos mass-media, e das agências de publicidade, nos seus caríssimos charlatanismos experimentais...)
E foi também o tempo, inapelável, quem trouxe outros carros,
outros aparelhos de som, e a boa da minha fita-cassete foi perdendo a razão de
ser, até se tornar nessa inutilidade que carreguei carinhosamente, por tanto tempo.
Como última homenagem, amortalhei-a num guardanapo de papel,
procurei um cantinho relativamente limpo, no caixote do lixo, e aí a joguei com
um gesto de também desnecessário dramatismo, sentindo que, de alguma forma,
alguma coisa se completava nesse ato sucinto, libertador, e estranhamente
dolorido.
Pensando a respeito, reconheço com alguma inegável
nostalgia, claro, que é perturbadora a existência desse horizonte maior, de que
ninguém fala. Mesmo quando cabe numa caixinha de plástico transparente,
enrolado numa cassete.
Amanhã, viajando, escutarei a cópia que mandei fazer para
CD. Pirata e sem alternativa.
Outubro de 2007
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