27 de out. de 2021

188 - REVISITANDO FOTOS ANTIGAS

 



Hoje abri uma caixa de fotos antigas às quais não prestava atenção há muito tempo. Encontrei-me em muitas, ainda criança em algumas, e noutras já em outras idades.

Sempre acho muito curioso este tipo de reencontro com imagens de nós mesmos e, no meu caso, sempre fico um pouco nostálgico quando me disponho a essa espécie de ritual de ir observando foto atrás de foto, tentando situar-me no tempo em que cada uma foi tirada, identificar nelas outras pessoas presentes, comparar diferenças entre os objetos de então e os de hoje, as roupas, as cores, enfim, tudo o que de alguma forma estranhe ou sinta diferente.

Creio que isso é o que todos nós fazemos, quando olhamos fotos antigas, apesar de ter a certeza que a forma de fazê-lo muda um pouco de pessoa para pessoa. Hoje, porém, ou por estar mais disposto ou por ter mais tempo disponível, talvez por não estar a pensar muito no que estava a fazer, sucedeu-me algo que ainda não tinha experimentado antes.

Estava a ver fotos que não tinha dificuldade de identificar, onde surgiam pessoas que também conheço desde sempre, e por isso não me surpreendiam os detalhes - razão pela qual estava relaxado e sem procurar minúcias e detalhes, como normalmente faço. E foi então que, olhando uma foto em que eu estava presente, fui além de me achar nela, recordar o momento e o lugar, e os outros presentes.

Além de tudo isso recordei claramente o que eu estava a pensar naquele momento enquanto, alguém tirava a foto. Recordei claramente o que alguns dos presentes estavam a dizer, o contexto em que tudo se passava, e o aborrecimento imenso que isso me causava. Não sei bem como explicá-lo, mas recordar assim foi algo estranho e muito belo.

Curiosamente, a minha expressão na foto não traduzia de forma nenhuma esse enfado, nem sequer um pouco da desilusão que sentia na altura em que tudo estava a passar-se. Na imagem, apareço atento e sério, contido mas observador. Ninguém seria capaz de adivinhar, pelo meu aspeto, o que me ia na mente.

E hoje, ao lembrar-me exatamente de quais estavam a ser esses meus pensamentos, e ao ver como eles não transpareciam na expressão que exibia, admito a possibilidade de ter descoberto o momento exato ( e de haver um registo fotográfico dele, que só eu conheço ) em que verdadeiramente comecei a crescer como indivíduo consciente, capaz de reservar para mim mesmo a minha opinião e o que pensava, simplesmente por não achar necessário intervir ou compartilhar nada disso. 

Hoje em dia, quando escrevo, mesmo que não seja opinando ou criticando, deixo conscientemente que transpareça de mim o que penso e sinto sobre aquilo que escrevo, ao contrário do que fiz naquelas fotos que alguém tirou e que só vim a conhecer muitos anos depois. E apesar de isso ser o oposto exato do recolhimento em que hoje me vi nelas, permite-me cumprir o mesmo objetivo no tempo e voltar a encontrar estados de espírito e memórias, pensamentos e vontades, e sentimentos guardados preciosamente para um dia.

Eis porque admito que a minha escrita, os meus textos, são como fotos antigas cada um deles. Que depois me permitem ver como cresci ou mudei, e como me contive ou não em todo esse processo de registar a vida e os instantes. 

Um dia encontrar-me-ei comigo, em cada um deles, e reconhecer-me-ei. E depois decidirei o que faço com isso, se é que posso fazer alguma coisa. 


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