Procurei entender os ecos do mundo,
nas tardes dos dias, e nas noites.
Quis aprender a canção alegre
das plantas na chuva, quando as folhas
ressoavam murmúrios graves
na antecipação de mais nuvens,
e depois quando choravam de alegria,
lágrimas infinitamente puras
pingando em efémeras poças espelhadas.
Fiz ecos de silêncios ricos de nada,
em que sobravam vozes dissonantes,
passos invisíveis, motores ao longe,
risadas de multidões solitárias, em bares,
e pequenas histórias brevemente contadas
pelo pó dos caminhos
que brisas ligeiras pulverizavam
por sobre os momentos.
Armei-me de tudo isso caminhei,
vaguei pelas planícies longas das palavras,
inebriado pelos álcoois subtis que o espírito
derramava na minha vida e no meu fado
como bênçãos maravilhosas.
Segui olhando em redor, voluptuosamente,
feliz e firme, atento ao mundo e aos outros,
engajado, partilhando, sendo tantos.
E aos poucos descobri olhares de inquietude.
Vozes que não tinham voz, prisioneiras,
retidas ainda num outro tempo vago
de que não sabiam falar.
Aprofundei-me nos pequenos nadas
de histórias ainda por nascer,
e aos poucos foram-me chegando dores e mágoas,
tristezas de passarinhos ímpares
em prisões terríveis de gaiolas abertas,
sagas de vestidos de baile e borboletas
adejando em valsas solitárias
que ninguém entendia.
Soube de poesias ímpares
escritas por músicos que não tocavam,
num flagelo de ressentimentos e
de oportunidades perdidas.
Conheci caminhos abertos esforçadamente
que, depois, ninguém seguiu.
Dei-me a mais conversas. Ensinei caminhos
feitos de palavras que abriam caminhos
que levavam a mais palavras,
tantas vezes partilhando a magia
do que não sabia saber.
Escutei os pontos de vista vagos
da mosquinha alienígena viciada
no isolamento dos cantos das paredes,
até que ganharam corpo e foram voz
e se ergueram em pensamentos belos
sobrevoando a mediocridade de tantos.
Mostrei oportunidades e desfiz-me em sonhos
fortuitos, que não pretendia sonhar,
enquanto lentamente me esquecia de mim,
do que me era vital e compunha.
Criei dramas e personagens, amei com eles,
fiz-lhes as viagens e sofri-lhes as desilusões,
morri mil vezes, perdido nos seus enredos únicos
de filhos promissores.
Depois esgotei-me,
incapaz de manter o esforço de criação,
a duplicidade de vidas intensas,
e precisei parar.
Lentamente, retempero-me
em montanhas vagas e fontes de fantasia,
em hesitações de poeta outra vez novato
que se descobriu subitamente cansado.
Fatigado demais para usar outras
que não a sua própria voz,
ou seguir outros caminhos
que não os seus.
copyrightHenriqueMendes2020
Me encanta tu poesia amigo..
ResponderExcluirMuchas gracias, Matildes. Eres siempre muy bienvenida a mi blog
ExcluirMuito lindo ver este poeta tomando posse dos sentimentos do mundo, esmiuçando cada detalhe, vivendo com seus personagens cada fantasia, cada inspiração até a mais completa exaustão...e depois precisar parar, recomeçar como um "novato"que só conta com a própria voz e que prossegue pelos próprios caminhos. Poeta, você tem uma alma linda, sensível, seus textos emocionam e mostram a riqueza do seu processo criativo.Parabéns! Que venham mais para nosso prazer. Grande abraço
ResponderExcluirMuito obrigado, Alcione. De alguma forma tinha-me escapado este seu comentário. Pensando sobre ele, usando os seus conceitos, acredito que um Poeta sempre se reinventa e renasce periódicamente, e é isso que o mantém Poeta, e lhe mantém essa capacidade de vibrar com os detalhes. Um grande abraço!
ExcluirNo afã da vida, deixo passar os detalhes. Agora percebo que quem quer ser poeta tem que passar pelos detalhes, tem que se esgotar para recomeçar.
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