Creio que esperava
que numa dessas noites vulgares, anónimas,
impossível de apontar ou distinguir,
algo acontecesse que me fizesse crer
que já bastava, que agora era de vez,
que não valia a pena a teima constante
nas letras de todos os dias,
que era chegado o fim.
Mas não foi assim.
Apenas não foi, nem sequer assim.
Um dia passou, sem que o notasse, ligeiro.
Depois passaram outros, sem nenhum mal advindo.
E foi ficando claro, nessas palavras
que não me procuravam para nascer,
nessa coisa desenrolando-se
como balanço de barco em mar chão,
que navegava num rumo que, tendo origem,
era sem porto de destino.
Talvez por isso, as sombras das nuvens
se mostraram supérfluas e fugazes,
breves nos seus caminhos erráticos
ao meu redor, nunca de grande trovoada.
Tampouco as chuvas
foram mais do que água caindo, vital e
necessária para o mundo,
jamais as lágrimas tristes que um dia receei ver
molhando o que o meu olhar podia abarcar.
Não encontrei no espelho trejeitos de surpresa.
Nem de desistência, no que apenas não nasce.
Nem de impossibilidades, num futuro sempre estranho.
Nem de paz, lá onde se debatem as emoções.
Apenas a liberdade profunda, sem compromissos
nem datas, sem expectativas ou desafios,
de ir sendo ao acaso dos dias.
E assim, evanescente e cansado,
sem nenhum tipo válido de adeus,
deixo às palavras o etéreo fardo de me encontrarem.
Ou não...