Talvez um dia me encontres por aí,
sentado num canto qualquer de algum lugar,
provavelmente rabiscando folhas soltas
ou lendo, com aquele tipo de entrega total
típico de quem não poderia ser diferente.
Ou talvez frente ao computador,
num outro canto de outro lugar, lançando linhas
noutras vastidões além do papel,
guardando instantes prenhes de desnecessidades.
Ou ainda, talvez me encontres
andando pelas ruas, tranquilamente,
lançado em passos de acasos e surpresas.
Talvez traga ainda, brilhando nos olhos,
as cores vagas de algum fim de tarde,
se já for manhã,
ou talvez ainda ostente
aquele subtil aturdimento indefinível
de quem se escutou profundamente
no silêncio amplificador do amanhecer.
Mas não te preocupes...
Serei sempre eu, mesmo que envolto
na leve neblina duma solidão escolhida,
ou mesmo que coberto por uma espécie de manto
feito do distanciamento do ruído dos outros.
Terei subido a montanha, talvez,
e buscado aquele isolamento mínimo vital
onde só chegam os pensamentos mais necessários
ao momento imediato, um de cada vez.
Aos outros, estarei provavelmente a escolhê-los,
filtrando-os, elegendo gratas memórias e prazeres,
banhando-me no sabor doce das pequenas vitórias.
Terei deixado de lado, talvez, a poeira agreste
do que é para ser esquecido, ou do que não quero lembrar.
Por isso, se me vires assim, não importa onde for,
presente mas ausente, anuindo, deixando que seja,
não estranhes e procura entender.
Há uma parte de mim que ainda deixo como ponte.
Há uma parte de mim que ainda é de todos.
Só a maior parte se remeteu, talvez, a um silêncio
onde faço as escolhas que, depois,
reparto com os teus silêncios.
imagem colhida na net, sem indicação de autor
CopyrightHenriqueMendes/2019
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____ Muito lindo esse seu divagar...Nota-se quando a poesia é realmente sentida
ResponderExcluirNão sei se li com o cerebro ou o coração.Fiquei pensando nos últimos cinco versos.
ResponderExcluirTalvez por serem os últimos.Bj.